sábado, 25 de dezembro de 2010

CARTA DE JUNDIAÍ - RECORDAR É VIVER !


CARTA DE JUNDIAÍ



"Enquanto andávamos nessa mata a cortar lenha, atravessavam alguns papagaios essas árvores; verdes uns, e pardos, outros, grandes e pequenos, de sorte que me parece que haverá muitos nesta terra". Pero Vaz de Caminha



Desde o longínquo 1º de Maio de 1500, nas areias de Porto Seguro, quando Pero Vaz de Caminha sentou-se a escrever as notícias da terra nova, a beleza da fauna brasileira desperta a admiração do homem ocidental.


Antes do conquistador, em datas imemoriais, o próprio indígena dedicava-se ao culto dessas espécies, não apenas em adornos, mas utilizando-as como animais de companhia. SPIX e MARTIUS, em suas incursões pelo sertão brasileiro, no início do Século XIX, eram testemunhas oculares dessa cultura e anotaram, enquanto viajavam pelo Vale do Mucuri: "Encontra-se freqüentemente o mutum domesticado nas casas dos índios" (Viagem pelo Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 1981, v. II, p. 65).


O brasileiro contemporâneo é culturalmente herdeiro dessa tradição.


A Constituição de 1988 não poderia trair a herança cultural do brasileiro contemporâneo. E, de fato, o constituinte não apenas soube respeitá-la, como, em seu peculiar refinamento, vislumbrou aspectos ambientalmente desejáveis na criação de espécies da fauna nativa. Daí estipular seu art. 225: "incumbe ao Poder Público: [...] prover o manejo ecológico das espécies".


Na atualidade, vários setores da sociedade organizam-se e buscam, com muita dificuldade, dar cumprimento a essa vontade do constituinte. Enquanto diversos ecossistemas são degradados pela ação incessante das motosserras e dos pesticidas, uma parcela de brasileiros e de brasileiras atua anonimamente, no interior de suas casas e de seus ambientes de trabalho, para decifrar os hábitos alimentares de espécies da fauna nativa, para identificar as características de seu comportamento e, sobretudo, para descortinar a forma de seu acasalamento.


Esse trabalho tem produzido resultados. Há inúmeras espécies de psitacídeos que podem ser poupadas da extinção porque o homem hoje domina as técnicas de sua reprodução ex situ. O mesmo acontece com quelônios, passeriformes, serpentes, primatas, felídeos, falconiformes e outras espécies, que são proficuamente reproduzidas em criatórios legalizados por todo o País.
Mas nem tudo são flores para esses criadores.


Numa absoluta inversão de valores, a entidade estatal - o IBAMA - que deveria primar por garantir que a fauna nativa seja poupada da extinção vem, a cada dia, tornando mais difícil a sobrevivência desses criatórios. Os estorvos são tantos e tão variados, que os criadores passam, eles próprios, a correrem risco iminente de extinção...


Alguns exemplos demonstram essa realidade dantesca.


A atividade comercial de criação, em diversas oportunidades, deixa, propositadamente, de ser regulamentada por quem deveria fazê-lo, para que a omissão normativa aquiete o ímpeto do cidadão que pretenda dedicar-se a ela.


Os protocolos de aprovação de projetos de criatórios e de estabelecimentos comerciais estão cada vez mais repletos de exigências de infra-estrutura, muitas delas contrárias às noções mais elementares ensinadas pelos biólogos e veterinários que trabalham no ramo.


A burocracia é incrementada ao extremo durante os trâmites dos processos administrativos para aprovação de projetos junto ao IBAMA, de modo que o incauto candidato a criador desista definitivamente de seu propósito.


Por fim, o cidadão comum, consumidor final, que pretende manter legalmente consigo seu espécime de estimação, seja ele pássaro ou psitacídeo, réptil ou mamífero, é de todos os modos achacado por propaganda ideológica maciça, toda ela dirigida a criar no imaginário popular uma visão artificial e mentirosa, de que possuir consigo animais da fauna nativa é algo reprovável, é algo criminoso.


Aqui, também, não são poucos os exemplos.


A todo momento, em diversos pontos do Território Nacional, alguém do IBAMA surge em reportagem de veículo de comunicação de massa e afirma candidamente que as pessoas devem evitar possuir animais nativos em casa, pois tal conduta é proibida em lei. Trata-se de afirmação vergonhosamente falsa. O ordenamento jurídico prevê a criação legalizada da fauna brasileira.

Aliás, a Constituição impõe ao Poder Público - obviamente inclui-se aí o IBAMA - o DEVER de prover o manejo ecológico das espécies nativas.


Como se não bastasse, neste momento é divulgada pelo IBAMA, nas escolas do Distrito Federal, uma suposta Campanha Nacional de Proteção à Fauna, cuja principal bandeira consiste em associar a criação de animais pelo homem ao tráfico de exemplares silvestres, fazendo com que crianças e adolescentes confundam a atividade legal e o crime ambiental...


A Lei n. 5.197, há mais de 40 anos, encarrega o Poder Público de estimular a construção de criadouros de "animais silvestres" (art. 6º, "a").


Uma pequena minoria de servidores do IBAMA, porém, arrogou-se o direito de estufar o peito e afirmar que o IBAMA não é órgão de fomento à criação... Infelizes! Não sabem eles que esse tema não está sujeito a uma questão de escolha ideológica... Não se trata de um problema de filiação à ONG alfa ou beta... Ele não se confunde com um simples ideal estético... O direito de criar e o dever do IBAMA em prover, estimular, fomentar essa atividade decorrem do art. 225 da Constituição Federal. A Lei n. 5.197/67, logo abaixo na hierarquia, segue em vigor e em perfeita harmonia com a Carta Magna...


Durante os últimos anos, os criadores assistiram atônitos ao surgimento dessa corrente. É verdade que a maior parte dos servidores do Instituto cumpre fielmente as atribuições de seus cargos. Mas aquela pequena minoria, bem articulada, põe em xeque toda a atuação da autarquia. Assim, os criadores contemplam impotentes os supostos agentes públicos - muitos deles filiados as ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS de objetivos duvidosas, inclusive ESTRANGEIRAS - começarem a ocupar postos de decisão importantes na estrutura do IBAMA. E assiste prostrados sua atividade ser gradativamente inviabilizada.


Mas como o amor pelo que fazem é maior do que o apego a ideais estéticos e supera posturas ideológicas, os criadores decidiram não se entregar.


Reunidos, hoje, na cidade de Jundiaí, estes verdadeiros brasileiros puderam dialogar, trocar relatos e experiências, fazer o diagnóstico de sua conjuntura atual. Após um dia inteiro de trabalho, traçaram os rumos das atitudes que, a partir de agora, irão tomar em defesa de sua atividade, para que se cumpram a Constituição e a lei.


As recentes atitudes da minoria de servidores do IBAMA, que busca inviabilizar a criação, produziram um importante fruto: unir todos os setores de criação legalizada de fauna nativa no Brasil em torno de um único ideal e de uma estratégia comum, a sobrevivência de seus empreendimentos e a sobrevivência das espécies animais brasileiras.


De agora em diante, este movimento organizado irá lutar em todas as frentes, usando todos os caminhos institucionais, extrajudiciais ou mesmo judiciais, para a defesa e a continuidade de suas atividades. Nenhum evento ou ato que viole a Constituição e a Lei n. 5.197/67 deixará de ser questionado publicamente e, sobretudo, perante os veículos oficiais de controle estatal.


O Decreto n. 6.514/2008, já hostilizado pelo Ministério da Agricultura, será devidamente questionado pelos criadores. Igual destino aguarda a Instrução Normativa n. 169/2008, do IBAMA.


O mesmo se diga da lista de animais pet, ansiosamente aguardada pelos profissionais da área.

É preciso rebater de modo contundente o falso argumento de que a criação legalizada de animais nativos é um "problema" para o meio ambiente.


É preciso recordar que essa criação é uma aliada fundamental da causa ambiental.


É preciso trazer à tona o entendimento da própria CITES - Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e da Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção - para quem a atividade comercial legalizada de animais da fauna nativa "puede favorecer la conservación de especies y ecosistemas y/o el desarrollo de la población local si se efectúa a niveles que no perjudiquen la supervivencia de las especies concernidas" (Resolução da 8ª Reunião da Conferência das Partes, Kyoto, 1992).


É preciso, por fim, recordar que o próprio CONGRESSO NACIONAL BRASILEIRO, no relatório final da CPI do Tráfico de Animais e Plantas Silvestres, concluiu: "a criação e comércio de animais silvestres, como uma atividade regular, que observe todos os requisitos das normas ambientais e a legislação como um todo, deve ser incentivada pelo Poder Público". Aliás, já no marco pós-1988, existe Decreto Presidencial que impõe ao Poder Público o dever de fomentar a criação ex situ (Decreto n. 4.339/2002), até agora olimpicamente descumprido.

Espera-se, por outro lado, que o Ministro do Meio Ambiente e o Presidente do IBAMA, pessoas íntegras e certamente alheias a esses movimentos internos, comovam-se diante do esforço de sobrevivência praticado pelos criatórios.

No Brasil de hoje, os criadores de animais nativos são os verdadeiros Noés, cujas arcas, implacavelmente atacadas, ameaçam ir a pique levando consigo grande parte do patrimônio genético de quase um continente.

Jundiaí, 1º de novembro de 2008.

ABRASE - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CRIADORES E COMERCIANTES DE ANIMAIS SILVESTRES E EXÓTICOS

ACASCO - ASSOCIAÇÃO DOS CRIADORES DE ANIMAIS SILVESTRES DO CENTRO-OESTE

CBRAS - CONSÓRCIO BRASILEIRO DE CRIATÓRIOS DE AVES SILVESTRES

COBRAP - CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DOS CRIADORES DE PÁSSAROS NATIVOS

FEBRAPS - FEDERAÇÃO BRASILEIRA DOS CRIADORES DE PÁSSAROS

FEPARJ - FEDERAÇÃO DE CRIADORES DE PASSERIFORMES CANOROS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

3 comentários:

  1. Caros companheiros, sou editor do blog fibrapura.blogspot.com e seguidor assíduo de seu blog. Gostaria de reproduzir a postagem acima com a autorização de V.Sa. Luto praticamente sozinho aqui no Mato Grosso e minha única arma é o meu blog, preciso de subsídios para a empreitada.
    Atenciosamente.
    Luiz Antonio Fernandes
    TANGARÁ DA SERRA - MT

    ResponderExcluir
  2. Olá Luiz, obrigado por ser um dos nossos leitores e seguidores, ficando autorizada a reprodução da postagem acima e qualquer outra, só pedindo,como de praxe, que faça constar a fonte de onde veio. Sucesso nessa empreitada e feliz 2011 !

    Os editorees.

    ResponderExcluir
  3. sr. Pêssego, espero um dia poder conhecê-lo pessoalmente. Moro no Mato Grosso, Pontes e Lacerda, e tenho defendido a criação ex-situ em criadouro há muitos anos. Recentemente pus no ar o meu site. Lendo suas postagens venho pedir-lhe a permissão para poder reproduzir em meu site o texto acima, tendo em vista que nele também tenho um espaço para postagens. www.criadourocasapequena.com.br

    José Pereira da Silva Neto
    Pontes e Lacerda, MT

    ResponderExcluir